UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
Os Efeitos da Declaração de Insolvência no Contrato de Arrendamento Urbano
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Mestrado em Direito
Faculdade de Direito | Escola do Porto 2020
UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA
Os Efeitos da Declaração de Insolvência no Contrato de Arrendamento Urbano
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Sob a orientação da Professora Doutora ▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇
Mestrado em Direito
Faculdade de Direito | Escola do Porto 2020
Aos meus pais, por tudo o que sou, e por tudo o que serei.
“O teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrares o Direito
em conflito com a Justiça, luta pela Justiça.”
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Antes de iniciarmos este estudo, cumpre-me prestar um agradecimento sincero a todos aqueles que contribuíram de variadíssimas formas para o culminar de mais uma etapa do meu percurso académico.
Primeiramente aos meus pais, por tudo o que têm sido para mim, pelo amor e apoio incondicional e por todos os esforços e conselhos que me permitiram evoluir e ter força para concluir este trabalho. Efetivamente, nem todos os heróis usam capa.
Às minhas avós, por serem um poço de sabedoria e por terem sempre algo extraordinariamente simples, bonito e encorajador para me dizer.
À minha tia ▇▇▇▇▇, por tudo o que fez por mim e por me ter dado a paz e a tranquilidade necessárias para concluir este trabalho.
A todos os meus familiares, pela preocupação, carinho e pelo incentivo que sempre me deram em todos os momentos.
Aos meus amigos por terem estado presentes, e por todas as palavras de incentivo, ajudando-me nos momentos mais difíceis.
À professora ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, por me ter ensinado a não desistir dos meus sonhos e por ter contribuído para o início de todo este percurso.
À Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, minha Alma Mater, por ter feito de mim jurista e por me ter dado as bases necessárias para a elaboração deste trabalho.
À Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, pelo ensino prático e aprofundado que me proporcionou e, em especial, às funcionárias da biblioteca pela sua simpatia e por toda a disponibilidade demonstrada.
À minha orientadora, Professora Doutora ▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇, por me ter apoiado e despertado a curiosidade por este tema, pelas aulas cativantes a que tive o prazer de assistir, e por toda a frontalidade e ajuda demonstrada ao longo deste percurso.
Por tudo isto, esta dissertação é tão vossa como minha.
Com o presente estudo iremos analisar os efeitos da declaração de insolvência no contrato de arrendamento urbano com o objetivo de distinguir as implicações que a insolvência do arrendatário e do senhorio ▇▇▇▇▇▇ para o arrendamento não habitacional e habitacional.
A abordagem passará assim por uma primeira análise ao princípio geral quanto a negócios não cumpridos, bem como ao papel desempenhado pelo Administrador da Insolvência. De seguida, analisaremos as características do contrato de arrendamento urbano, terminando com a análise pormenorizada do artigo 108º CIRE relativa à insolvência do arrendatário e do artigo 109º CIRE aplicável à insolvência do senhorio.
Por fim, vamos atentar ao reconhecimento dado ao arrendatário dos direitos que lhe são conferidos pela Lei Civil, tais como a transmissão da posição contratual e o direito de preferência.
With this study we will analyze the effects of the declaration of insolvency on the urban lease agreement for the purpose of distinguishing the implications that the insolvency of the tenant and landlord will bring to the non-housing and housing lease.
The approach will thus include a first analysis of the general principle of unfulfilled business, as well as the role played by the insolvency administrator. We will then analyse the characteristics of the urban lease agreement, ending with a detailed analysis of Article 108º CIRE on the insolvency of the tenant and of Article 109º CIRE applicable to the insolvency of the landlord.
Finally, we will pay attention to the recognition given to the tenant of the rights conferred by Civil Law, such as the transfer of the contractual position and the right of preference.
Palavras-chave: declaração de insolvência; administrador da insolvência; massa insolvente; credores; arrendamento; habitacional; não habitacional; senhorio; arrendatário.
Key Words: declaration of insolvency; insolvency administrator; insolvent estate; creditors; rent; housing; non-residential; landlord; tenant.
Índice
1. Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso 2
1.1. Princípio geral quanto a negócios não cumpridos 2
1.2. Requisitos Cumulativos na aplicação do Artigo 102º do CIRE 3
2. Regime Jurídico: A Suspensão do Contrato 5
3. As opções do Administrador da Insolvência 6
3.2. Consequências da Recusa do Cumprimento 8
4. Regime Imperativo do Art. 119º CIRE 11
5. Contrato de Arrendamento Urbano 12
6. Insolvência do Arrendatário 14
6.1. Arrendamento para Fins Não Habitacionais 14
6.1.1. Denúncia do contrato 17
6.2. Arrendamento para Fins Habitacionais 18
6.3. Impedimentos à resolução do Contrato de Arrendamento Urbano 20
6.4. Locado ainda não entregue ao Arrendatário 22
7.2. Reconhecimento dado ao arrendatário dos direitos conferidos pela Lei Civil 25
7.2.1. Transmissão da Posição Contratual 25
7.2.2. Direito de Preferência 29
AI – Administrador de Insolvência
Art. – Artigo
CC – Código Civil
Cfr. – Conforme
CIRE – Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas
CPC – Código de Processo Civil
CPEREF – Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência
Dec. – Decreto Ex. – Exemplo In – No
NRAU – Novo Regime do Arrendamento Urbano
Pág. - Página
RAU - Regime do Arrendamento Urbano
RJOPA – Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados
ROA – Revista da Ordem dos Advogados
SS. – Seguintes
STJ – Supremo Tribunal de Justiça
TRC – Tribunal da Relação de Coimbra TRG – Tribunal da Relação de Guimarães TRL – Tribunal da Relação de Lisboa TRP – Tribunal da Relação do Porto
V.g – ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ (por exemplo)
Vd. – Vide
Vol. – Volume
A dissertação que ora apresentamos centra-se nos efeitos que a declaração de insolvência produzirá no contrato de arrendamento urbano e as suas implicações para o senhorio e arrendatário.
A pertinência da análise deste tema é explicada pela frequência com que estas situações ocorrem, por não ter sido objeto de tratamento aprofundado pela doutrina e ainda pelo facto de relacionar temas como o arrendamento urbano (pautado por sentimentos sociais de proteção dos arrendatários) e o direito insolvencial (que privilegia os superiores interesses da massa insolvente e dos credores).
O objetivo será então perceber a influência que a insolvência de um dos intervenientes, consoante seja o arrendatário ou o senhorio, terá no decurso do contrato.
A estrutura deste trabalho partirá assim de um estudo do artigo 102º do CIRE que se refere ao princípio geral da declaração de insolvência sobre os negócios em curso, o que será “normalmente” uma suspensão do cumprimento do contrato até que o administrador da insolvência declare optar pela execução ou pela recusa do cumprimento. Veremos que a opção do administrador de insolvência não é de todo arbitrária, devendo pautar-se por uma preocupação da maximização da massa insolvente e os
superiores interesses dos credores.
Depois de analisar o princípio geral, iremos analisar o contrato de arrendamento urbano como contrato de locação.
De seguida, vamos distinguir a insolvência do arrendatário consoante se destine a um arrendamento não habitacional e aqui poderá haver a denúncia pelo Administrador da Insolvência, contrariamente ao caso de o locado se destinar à habitação do insolvente.
Entretanto, vamos atentar ao facto do próprio senhorio não poder resolver o contrato de arrendamento urbano nos casos de haver falta do pagamento de rendas anteriores à declaração de insolvência e ainda por deterioração da situação financeira do arrendatário.
Por fim, analisaremos a situação em que o insolvente é o senhorio, sendo que ao haver a alienação do locado no processo de insolvência, o arrendatário não será privado dos direitos que lhe são reconhecidos pela lei civil, tais como a transmissão da posição contratual do locador e o direito de preferência.
1. Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso
1.1. Princípio geral quanto a negócios não cumpridos
Quando as partes pretendem realizar um negócio jurídico, geralmente, celebram um contrato, com determinados direitos e obrigações, acontece que, não raras vezes, durante a execução do mesmo, pode surgir a declaração de insolvência de um dos contraentes, o que irá impossibilitar/congelar o cumprimento pleno das obrigações estipuladas.
Era há muito reclamado um princípio geral do CIRE relativo à insolvência de um dos contraentes durante a execução de um contrato, uma vez que na altura do CPEREF (não havendo um princípio geral, mas apenas uma regulamentação casuística de vários negócios jurídicos) remetia-se para o artigo 1197º do CPC de 1961 que sujeitava o cumprimento do contrato consoante a conveniência para os interesses da massa insolvente.
Assim sendo, e para suprir a falta de um princípio geral no CIRE, surge o artigo 102º com uma epígrafe desde logo enganadora1, na medida em que fala de um “princípio geral” quanto a “negócios não cumpridos” pretendendo assim estabelecer uma norma de aplicabilidade geral para os negócios que ainda estão em curso e em que ainda não houve um total cumprimento por nenhuma das partes.
O facto de o preceito mencionar a suspensão dos contratos em curso não significa que seja a regra geral, mas apenas uma solução supletiva, uma vez que pode suceder a manutenção ou extinção do contrato, dependendo da situação em apreço e da vontade do administrador da insolvência que deve ser pautada pelo princípio par conditio creditorum e a maximização da massa insolvente.
Posto isto, consideramos não haver um “verdadeiro” princípio geral já que o regime do CIRE não prevê os efeitos sobre todos os negócios em curso. Nas palavras de
1 “II- As reservas postas ao significado, como princípio geral, do regime fixado no art.º102º têm dois fundamentos. Por um lado, o seu nº1 começa por ressalvar o disposto nos artigos seguintes, ou seja, artigos 103.º a 118.º, nos quais são tratadas, casuisticamente, várias categorias de negócios jurídicos, sem dúvida as mais significativas do ponto de vista dogmático e prático. Mas o «princípio geral» cede também perante soluções especiais que constem de diplomas legais avulsos, isto é, para além do Código. Resulta, assim, muito menos amplo, do que à primeira leitura se poderia pensar, o campo de aplicação do referido princípio geral.” ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2009), “Colectânea de Estudos sobre a Insolvência”, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, págs. 211 e 212
MENEZES LEITÃO2 “(...) uma norma sobre contratos bilaterais dificilmente pode ser elevada à categoria de princípio geral, uma vez que os contratos não sinalagmáticos ficam de fora e em relação a estes não aparece qualquer regime.”, e ainda pelo facto de se encontrar, em diplomas legais avulsos, normas que se aplicam a outros negócios jurídicos que não constam do CIRE3.
1.2. Requisitos Cumulativos na aplicação do Artigo 102º do CIRE
Inicialmente, o art. 102º CIRE faz uma ressalva, “[s]em prejuízo do disposto nos artigos seguintes (...)” pretendendo com isso salientar a imperatividade dos preceitos mencionados nos artigos 103º a 118º face ao explanado neste preceito.
Para que se aplique a suspensão do contrato até decisão do AI é necessário o preenchimento de certos requisitos cumulativos, como a existência de um “contrato bilateral” na qual “não haja total cumprimento nem pelo insolvente nem pela outra parte (...)”4.
Relativamente ao requisito da bilateralidade, parece-nos que o preceito exclui os contratos unilaterais, amparado não só pela natureza imperativa do art.102º CIRE (ditada pelo art. 119º CIRE), e ainda pelo facto do regime legal estar pensado para uma relação bilateral5, contrariando assim a posição defendida por ▇▇▇▇▇▇▇▇ ASCENSÃO que estabelece uma aplicação analógica do art. 102º CIRE aos contratos unilaterais6.
2 In, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2004), “Os efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso”, in Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, publicação do Ministério da Justiça, Gabinete de Política Legislativa e Planeamento, pág. 63”
3 “Cfr., p. ex., o art. 98.º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro. Pode também colocar-se a questão de saber se um contrato não previsto expressamente fica sujeito ao regime do art.102º ou se há que recorrer, por via analógica designadamente, a outra norma: v., p.ex, para a cessão de créditos em garantia, ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇, A cessação de créditos em garantia e a insolvência, Coimbra Editora, 2007, pág. 831 e ss..” ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Um Curso de Direito da Insolvência”, 2ª Edição revista e atualizada, Almedina, pág. 171 nota de rodapé 64
4 “(...) estando claramente excluídos da aplicação deste regime os contratos que tenham sido, previamente à declaração de insolvência, resolvidos por uma das partes por incumprimento ou aqueles ainda não resolvidos, mas cujo cumprimento tenha sido impossibilitado por uma das partes.” ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ (2017), “Os Efeitos da Insolvência Sobre o Contrato-promessa em Curso”, 2ª edição, pág. 81
5 “A existência de um negócio jurídico unilateral ou de um contrato unilateral está dissociada do sinalagma funcional e, assim, não é compatível com o regime jurídico previsto no art.102º- opção pela execução ou pela recusa de cumprimento; necessidade de a execução pressupor a possibilidade de realização pontual da contraprestação pelo administrador da insolvência.” EPIFÂNIO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Manual de Direito da Insolvência”, 7º Edição, Almedina, pág. 208
6 “(...) Que regime aplicar então a um negócio jurídico unilateral, em caso de insolvência? Supomos que a analogia com o contrato é determinante. Se o que se assegura é um tempo de espera, em que se pondera se o cumprimento é ou não benéfico para a situação decorrente da insolvência, então do mesmo modo parece aqui conveniente a suspensão. A comum natureza de negócio jurídico associado à ratio legis, ampara bem esta solução. Mas a aplicação é analógica, uma vez que não há razão para pretender que o legislador
Por outro lado, PESTANA DE VASCONCELOS7 considera que o princípio geral do art. 102º CIRE não se aplica aos contratos unilaterais, aos contratos bilaterais imperfeitos, e ainda aos contratos bilaterais em que já se tenha verificado o cumprimento de uma das partes.
De igual forma, GISELA CÉSAR8 afirma que se deve aplicar este princípio aos contratos sinalagmáticos em que nenhuma das partes cumpriu integralmente as suas obrigações, uma vez que “nestes contratos a execução de uma obrigação condiciona a execução da contraprestação”.
No que diz respeito ao não cumprimento total, procedeu-se a uma alteração pelo Dec. Lei nº 200/2004, de 18 de Agosto e, onde se lia “(...) quer pelo insolvente quer pela outra parte (...)”, significando que bastava um não cumprir para se aplicar o preceito. Hoje lê-se “(...) nem pelo insolvente nem pela outra parte (...)”, o que revela que, atualmente, é necessário a não realização das prestações por ambas as partes9.
Assim sendo, e perante uma situação em que não haja total cumprimento de ambas as partes, caberá ao administrador da insolvência determinar se executa ou não o contrato.10
disse menos do que queria.” ASCENSÃO, ▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág. 289
7In, VASCONCELOS, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ de (2006), “O Novo Regime Insolvencial Da Compra e Venda”, Revista FDUP, Ano III, pág. 537
8 Vd. ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ (2017), “Os Efeitos da Insolvência Sobre o Contrato-promessa em Curso”, 2ª
edição, pág.82
9 “Por outro lado, também fica por saber qual é o regime aplicável se por acaso a contraparte já cumpriu na totalidade a prestação a que se obrigara. Parece, nesse caso, que o art. 102º, não terá aplicação. Mas o que deve então fazer o administrador da insolvência? Cumprir ou aceitar o cumprimento, como defende Oliveira Ascensão, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ considera que deve a contraparte «reclamar o seu crédito face ao insolvente no processo de insolvência, ficando o devedor impedido de satisfazer este crédito». E julgamos que tem razão. Com efeito se uma das partes já cumpriu integralmente, há que ver se há alguma coisa a receber ou a entregar pela outra e verificar qual é o regime aplicável.” ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Um Curso de Direito da Insolvência”, 2ª Edição revista e atualizada, Almedina, pág. 172 10 É difícil dar outro entendimento à alteração da redacção do preceito, caso contrário teria sido inútil.
Mas a alteração parece incompreensível. Até agora tínhamos visto que o critério legal seria deixar sempre nas mãos do administrador a escolha entre cumprir e não cumprir; essa escolha desaparece quando um deles cumpriu já (totalmente). Porquê? Só encontramos uma explicação: em homenagem ao contraente que cumpriu já totalmente. Mas é uma justificação fraca. À lei cabem muitas outras finalidades, além de homenagear de olhos fechados bons cumpridores. Isto significaria que nestes casos o administrador teria de cumprir ou de aceitar o cumprimento, por mais nocivo que fosse para o processo de insolvência. A regra, assim interpretada, restringiria adicionalmente a extensão aparente do princípio geral do art. 102º/1” ASCENSÃO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág. 290
2. Regime Jurídico: A Suspensão do Contrato
Depois do exposto supra, caso se verifique o cumprimento dos requisitos cumulativos para a aplicação do art. 102º CIRE, “(...) o cumprimento fica suspenso até que o administrador da insolvência declare optar pela execução ou recusar o cumprimento.”11
Não nos referimos a uma suspensão sine die mas apenas transitória12, que surge assim de forma a proteger os credores do insolvente, retirando-se ao insolvente a possibilidade de cumprir os contratos que tenha iniciado e passando assim para o AI essa prerrogativa de administrar o património do insolvente.
Apesar de falarmos de uma suspensão automática do negócio, através do preceito podemos observar outras consequências, como a manutenção ou a extinção do contrato por parte do AI.
A opção13 por parte do administrador de insolvência não é computada de nenhum prazo nem especificidade quanto ao momento processual, devido às idiossincrasias e vicissitudes que o próprio processo de insolvência possa ter, sendo que no interregno dessa decisão suspende-se a exigibilidade das obrigações de ambas as partes, constituindo uma causa de exclusão da ilicitude do incumprimento enquanto a suspensão vigorar.
Posto isto, para que o prazo não se estenda ad aeternum e seja penalizada a contraparte, o art.102º/2 CIRE faz uma ressalva dizendo que “[a] outra parte pode, contudo, fixar um prazo razoável ao administrador da insolvência(...)” e conclui, atribuindo um valor ao silêncio14 das partes, “(...) findo o qual se considera que recusa15 o cumprimento”.
11 A Lei Brasileira nº 11.101, de 9 de Fevereiro de 2005 que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, no seu art. 117º, que não difere muito do nosso art. 102º, dando apenas umas linhas “mestras” de orientação ao administrador da insolvência, “Os contratos bilaterais não se resolvem pela falência e podem ser cumpridos pelo administrador judicial se o cumprimento reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e preservação de seus ativos, mediante autorização do Comitê.”
12 “A suspensão pode até ser considerada uma forma branda de congelamento das situações. Mas a suspensão nunca é por si uma solução. Dá tempo para que se pondere qual essa solução, mas não é mais que um status quo, que haverá que transcender.” ASCENSÃO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág. 298
13 A opção é considerada abusiva se for, como afirma o art.102º/4 “manifestamente improvável” o
cumprimento pontual das obrigações contratuais por parte do insolvente.
14 Ac. STJ de 22/02/2011, Processo: 1548/06.9 TBEPS-D.G1-S1, “I –A recusa de cumprimento dos contratos a que se refere o art. 102.º, nº1, do CIRE não exige declaração expressa, nem forma especial, aplicando-se-lhe os princípios dos arts 217.º e 219.º do C.C.”
15 O art. 218º CC diz que o silêncio vale como declaração negocial quando lhe seja atríbuido um valor pela lei, uso ou convecção.
▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇ a critica realizada a este preceito por ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ e JOÃO LABAREDA16 afirmando que “[d]a letra da lei resulta que a fixação do prazo, além de ser da iniciativa do outro contraente, não depende de decisão do tribunal. Não temos esta solução como a mais adequada, porquanto abre caminho a divergências quanto à razoabilidade do prazo fixado. Em todo o caso, se elas existirem, não se vê como a questão possa ser resolvida sem intervenção judicial.”
Sucede, assim, que caso o administrador de insolvência pretenda a execução do contrato, deve declarar essa vontade antes do prazo fixado pela contraparte.
3. As opções do Administrador da Insolvência
O AI assumindo a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessam à insolvência tem três opções17, ou opta pela execução, pela recusa ou não opta (o que terá valor de recusa).
Os negócios celebrados pelo insolvente após a declaração de insolvência serão, como refere o art. 81º/6 do CIRE, à partida ineficazes respondendo a massa insolvente pela restituição do que lhe tiver sido prestado segundo as regras do enriquecimento sem causa.18
A decisão do AI não é de todo livre ou arbitrária, devendo a sua atuação ter como objetivo a maximização da massa e dessa forma a satisfação do maior número de credores19, tendo sempre em linha de conta o princípio par conditio creditorum20 e ainda
16 In, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2005), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, pág. 394
17 O Administrador de Insolvência na Lei Espanhola (Ley Concursal 22/2003, de 9 de julio), no seu art.70º, tem, de igual forma, a faculdade de decidir o destino do contrato.
18 Discute-se na doutrina a este propósito se caso o insolvente pratique um ato tornado irregular pela declaração de insolvência, o AI poderá ou não ratificar tal ato caso o considere benéfico para a massa. Tendemos a concordar com a opinião que o AI poderá ratificar tal ato. No mesmo sentido veja-se o Ac. do STJ de 05/05/2011, Processo: 3667/04.7TJVNF-S.S1
19 “A concessão deste direito de opção ao administrador da insolvência resulta do facto de a insolvência consistir numa impossibilidade geral de cumprimento das obrigações, que justifica a adopção de medidas em defesa dos credores. Ora, se o insolvente se visse forçado a cumprir negócios em curso, os pagamentos que efectuasse beneficiariam alguns credores em detrimento de outros, sendo, por isso, que a lei estabelece que os credores perdem, com a declaração de insolvência, a possibilidade de exigir autonomamente os seus créditos. Correspondendo, no entanto, esses negócios a contratos bilaterais, o sinalagma leva a que a outra parte não seja obrigada a cumprir, se o insolvente não o fizer. Ora, como o cumprimento desses contratos pode ser conveniente aos interesses da massa, concede-se ao administrador a possibilidade de optar entre o cumprimento do contrato e a sua recusa, consoante for ou não conveniente para a massa. Assim se consegue conciliar os interesses da massa e a tutela da igualdade dos credores com o regime característico dos contratos bilaterais”. ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2018), “Direito da Insolvência”, 8ª Edição, Almedina, pág. 186
20 “O dever (de conteúdo positivo) de adoptar a decisão que seja “mais favorável aos interesses da massa” corresponde ao dever de adoptar a decisão mais adequada a uma satisfação eficiente e equitativa
o preceito do art. 102º/4 CIRE onde “[a] opção pela execução é abusiva se o cumprimento pontual das obrigações contratuais por parte da massa insolvente for manifestamente improvável.” que se poderá aplicar ao caso da opção do AI não respeitar o princípio da igualdade do tratamento dos credores.
A norma do art. 102º/4 CIRE em si apresenta-se desde logo restritiva referindo-se apenas à opção pela execução e olvidando-se dos casos em que a não execução21 também pode ser considerada abusiva22, por isso, parece-nos que se deve sujeitar a opção do administrador, como refere ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ à «sindicância da cláusula geral da boa fé»23 à imagem do que acontece no direito alemão.
Na possibilidade de existir uma opção abusiva de execução do contrato por parte do A.I. (isto é, quando a ação do A.I. acarreta para a massa insolvente um prejuízo considerável), a contraparte está protegida24, uma vez que o contraente não insolvente pode recusar cumprir a sua prestação fazendo uso da exceção de não cumprimento (428º CC) ou, por outro lado, acionando a massa insolvente através de ação declarativa que corre por apenso ao processo de insolvência25.
No caso do AI optar pela execução, o crédito adquirido pelo contraente não insolvente é um crédito sobre a massa, na qual tendemos a remeter para o art. 51º/1/f CIRE, com a epígrafe “[d]ívidas da massa insolvente”, que refere que “[q]ualquer dívida resultante de contrato bilateral cujo cumprimento não possa ser recusado pelo
dos direitos e dos interesses de todos os credores; o dever (de conteúdo negativo) de não adoptar a decisão que seja menos favorável aos interesses da massa (...)” ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇. (2014), “Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso: em busca dos princípios perdidos?”, I Congresso de Direito da Insolvência, Coordenação: ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, Almedina, pág. 209
21 Se não respeitar princípios e valores constitucionais, como é o caso do direito fundamental à habitação do art. 65º da CRP, vd. ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇. (2014), “Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso: em busca dos princípios perdidos?”, I Congresso de Direito da Insolvência, Coordenação: ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, Almedina, pág. 210
22 A opção pode ser abusiva se a recusa do cumprimento se revelar manifestamente nefasta para o próprio insolvente. Poderá inclusive ser o caso de um contrato de aluguer de uma máquina essencial para o término de um serviço que trará rendimentos ao insolvente.
23 In ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇. (2014), “Efeitos da declaração de insolvência sobre os negócios em curso: em busca dos princípios perdidos?”, I Congresso de Direito da Insolvência, Coordenação: ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, Almedina, pág. 210
24 Veja-se neste sentido, o Ac. TRC de 18/10/2011, Processo: 2873/10.0 TBLRA.C1, “4. Optando o administrador da insolvência, pela execução do contrato, pode o locador invocar o n.º 4 da referida norma, que prevê a reposição do equilíbrio de interesses em presença, através da possibilidade de qualificação como abusiva de tal opção.”
25 ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2005), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, nota:6 págs. 393 e 394
administrador da insolvência (...)”, exceção feita às contraprestações realizadas pela outra parte num momento anterior à declaração de insolvência ou que se reporte a período anterior da declaração26.
Posto isto, a massa insolvente irá assumir assim os direitos e obrigações do insolvente e o AI poderá exigir à contraparte o respetivo cumprimento das obrigações e vice-versa.
3.2. Consequências da Recusa do Cumprimento
Por outro lado, grande parte do art. 102º/3 CIRE é dedicada à explicação da opção do administrador da insolvência pela recusa27 do cumprimento do contrato.
Os problemas que surgem relativos aos negócios em curso não totalmente cumpridos prendem-se essencialmente com situações em que existem prestações já realizadas, prestações com valores diferentes28 e ainda prejuízos causados resultantes da recusa do cumprimento do contrato29.
A recusa do cumprimento pelo AI, segundo o art. 102/3/a) CIRE, não confere às partes o direito à restituição do que já tiver sido prestado (sendo que PESTANA DE ▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇ considera que esta alínea só se aplica a situações em que existam cumprimentos parciais de ambas as partes e uma equivalência das prestações que as
26 “Daqui resulta, por exemplo, que num contrato de fornecimento de mercadorias, o pagamento das que tiverem sido entregues antes da declaração de insolvência constitui simples dívida da insolvência, ao passo que o pagamento das que tiverem sido fornecidas após a declaração constituí dívida da massa.” ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2018), “Direito da Insolvência”, 8ª Edição, Almedina, pág. 187, nota de rodapé 249
27 Diversamente ASCENSÃO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág.306, “Vamos chamar a este fenómeno a reconfiguração da relação. A lei impõe às relações existentes um novo desenho em caso de recusa de cumprimento pelo administrador. No propósito de conciliar quanto possível as finalidades da insolvência com a situação da contraparte, a lei reformula as posições em presença, fazendo surgir novos poderes e deveres. Não a orienta neste momento a preocupação de uma indemnização da contraparte, porque não assenta na ideia de ressarcimento de prejuízos. A lei penetra nos próprios termos da relação, para a reconfigurar da maneira que considere mais conveniente.”
28 Cumpre aos preceitos nº 102/3/b/c efetivar o princípio da compensação do desequilíbrio entre a parte da prestação e a parte da contraprestação já realizadas.
29O art. nº102/d) pretende assim estabelecer o princípio da indemnização dos danos causados pelo não cumprimento.
mesmas efetuaram30 e não quando as prestações são diferentes.) Diferentemente, ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ defende a aplicação desta alínea apenas à restituição em espécie31.
De seguida, o art.102º/3/b) do CIRE estabelece que “[a] massa insolvente tem o direito de exigir o valor da contraprestação correspondente à prestação já efetuada pelo devedor, na medida em que não tenha sido ainda realizada pela outra parte;”. Este preceito pretende assim hipotizar uma situação em que o devedor já cumpriu uma parte a que estava obrigado, não tendo havido cumprimento da contraparte, e neste sentido a massa insolvente passa a ter o direito de exigir o valor da contraprestação32. No caso de o devedor insolvente não ter efetuado nenhuma prestação, a massa insolvente não tem direito algum, e a norma não se aplica.
No sentido inverso, o art. 102º/3/c CIRE refere-se a uma situação em que houve o cumprimento do contraente não insolvente surgindo assim um crédito sobre a insolvência, sendo que o valor da prestação do devedor, na parte incumprida, deve ser deduzido do valor da contraprestação correspondente que ainda não tenha sido realizado.
Esta última parte da norma consagra a teoria da diferença33 que será a diferença entre a situação real em que o próprio facto deixou o lesado e a situação hipotética em
30 Exemplificando a situação em apreço, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ de (2006), “O Novo Regime Insolvencial Da Compra e Venda”, Revista FDUP, Ano III, pág. 539, “(...) se se tiver acordado a entrega parcelar da mercadoria vendida, entrega essa acompanhada pelo pagamento de parte do preço correspondente às coisas entregues e essas prestações parciais já tiverem sido realizadas.”
31 ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2012), “O regime português da insolvência”, 5ª Edição, Almedina, pág. 95, explica que “Em primeiro lugar, a norma da al.a) do nº3 do art.102º carece de uma interpretação restritiva para que só se aplique à restituição em espécie, prevista, por exemplo, nos casos de resolução pelo art. 289º do CC por remissão do art. 433º também do CC. Seria incoerente excluir o direito à restituição em valor na al. a) e readmiti-lo depois na al. c), através da atribuição do direito à diferença de valor entre as prestações na parte em que não tenham sido cumpridas. Exemplifique-se pressupondo, por exemplo, que, no contexto de determinado contrato, as prestações de ambas as partes têm o mesmo valor (100.000 euros) e que o credor já realizou parcialmente a sua prestação (50.000 euros) atribuir-lhe, um direito calculado nos termos da al.
c) do n.º3 do art. 102.º significa, na prática, o mesmo que atribuir-lhe o direito à restituição em valor do que prestou: como se verá de seguida, de acordo com esta norma, ele tem direito ao valor da prestação do devedor na parte incumprida (100.000 euros), deduzido do valor da contraprestação que ele, credor, ainda não realizou (50.000 euros).”
32 Contra a expressão “valor da contraprestação”, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2005), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, pág. 395 , “(...) não deve ser entendida à letra e que, se a prestação não realizada pela outra parte for de coisa, é esta que, pelo menos em princípio, deve ser prestada e não o seu valor (...)”
33 Na interpretação de ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇/▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2010), “Insolvência e contrato- promessa – os efeitos da declaração de insolvência sobre o contrato-promessa com eficácia obrigacional”, in ROA, ano 70, Volume I/IV págs. 426 e 427 “(...) equivale a dizer que a contraparte tem direito à diferença de valor entre a prestação e a contraprestação, acrescida ou deduzida, conforme os casos, da diferença de valor entre a parte da prestação e a parte da contraprestação já realizadas. Se o credor tiver realizado a sua contraprestação em medida superior àquela em que o devedor cumpriu a sua obrigação, o direito à diferença de valor entre as prestações devidas será acrescido desta diferença. O mesmo vale, por maioria de razão, para a hipótese em que só o credor realizou uma parte da sua contraprestação. Neste caso, a aplicação da regra do art. 102º, nº3, al. c), do CIRE significa que o credor tem direito a uma compensação
que este se encontraria sem o dano sofrido, atribuindo assim ao credor o direito à diferença (se for positiva) entre os valores das prestações devidas acrescido ou deduzido da diferença de valor entre as prestações já realizadas34.
O art. 102º/3/d) CIRE, por sua vez, refere-se à indemnização dos prejuízos não abrangidos pelo direito de crédito emergente da recusa de cumprimento calculado nos termos das alíneas anteriores.
A indemnização estipulada apresenta-se limitada, desde logo pelo 102º/3/d/i) CIRE35 onde o direito de indemnização só existe na medida em que a massa insolvente tenha direito contra a outra parte, sendo que a intenção do legislador, nas palavras de ▇▇▇▇▇ DO ROSÁRIO EPIFÂNIO, foi assim garantir ao máximo o “congelamento da massa insolvente”36.
Para além desta limitação, é estabelecida uma outra na subalínea ii), afirmando que o crédito à indemnização é abatido da quantia que essa parte tenha direito a receber a título de prestação incumprida do dever, o que significa que os créditos não se sobrepõem, ou seja, se a outra parte tem direito a um valor correspondente à prestação que o devedor não realizou, no valor da indemnização abate-se esse quantitativo, o que acontecerá no caso de haver danos superiores causados à outra parte.
Esta indemnização constituirá um crédito sobre a insolvência 102/3/d/iii) CIRE, e não sobre a massa, o que já era previsto no art. 102º/3/c CIRE, isto porque tipicamente, e sendo este um crédito cujo fundamento é posterior à declaração de insolvência seria um crédito sobre a massa. Neste sentido, não devemos descurar a ressalva realizada pelo art. 51ºCIRE, “[s]alvo preceito expresso em contrário(...)”, sendo este um dos casos, não gozando assim das vantagens dos créditos sobre a massa, pelo que a satisfação do crédito fica dependente do que se apurar no processo de insolvência.
correspondente à diferença de valor entre as prestações, acrescida da restituição em valor da parte da contraprestação que realizou.”
34 “Suponhamos agora o seguinte: que, depois de um contrato de troca de um cavalo por um carro, o cavalo morre por culpa do devedor. (...)No exemplo de há pouco, o credor não entregaria o carro e podia pedir uma indemnização, v.g., de 200: a diferença entre a indemnização total e o valor do próprio carro não prestado. É a teoria da diferença.” J. ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇ (1990), Direito das obrigações, vol. II, Almedina, págs.392 a 394
35 “Para alguns autores (▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇) este direito depende do preenchimento do art.102, nº3, al.d), i), ou seja, de o devedor insolvente ter realizado a sua prestação parcialmente sem a correspondente contraprestação do contraente não insolvente. Contrariamente ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇ entende que o preceito se aplicas mesmo que o devedor não tenha realizado qualquer prestação.” EPIFÂNIO, Maria do Rosário (2019), “Manual de Direito da Insolvência”, 7ª Edição, Almedina pág. 211
36 In, EPIFÂNIO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Manual de Direito da Insolvência”, 7ª Edição, Almedina
pág. 211
Importa ainda atentar a uma limitação desnecessária37 realizada pelo art. 102º/3/e) CIRE onde o crédito e a indemnização se compensam com a quantia que a massa tiver direito a receber em contrapartida da prestação já efetuada. Acontece que dificilmente o contraente do insolvente terá direito à indemnização, por se tratar de um crédito da insolvência (o que dificultará o seu pagamento) e ainda pela possibilidade da massa poder declarar a compensação das obrigações ao abrigo da al. e).38
4. Regime Imperativo do Art. 119º CIRE
O art. 119º CIRE com a epígrafe “Normas Imperativas” estabelece no seu nº1 de forma mais genérica que é “(...) nula qualquer convenção das partes que exclua ou limite a aplicação das normas anteriores do presente capítulo.”39 pretendendo assim impedir estipulações inter partes que restrinjam as normas constantes dos arts. 103º a 118º do CIRE.
O art. 119º/2 CIRE sendo mais específico expõe que é “(...) em particular nula a cláusula que atribua à situação de insolvência de uma das partes o valor de uma condição resolutiva do negócio ou confira nesse caso à parte contrária um direito de indemnização, de resolução ou de denúncia em termos diversos dos previstos neste capítulo.”40, uma vez que não é pelo facto de a parte se encontrar num situação de insolvência que permite à
37 O art. 847º/2 do CC já estabelecia esta situação, “Se as duas dívidas não forem de igual montante,
pode dar-se a compensação na parte correspondente.”
38 “Ilustre-se a não linearidade – ou mesmo a tortuosidade do preceito com um exemplo. Imagine-se que o administrador da insolvência recusa o cumprimento de um contrato de prestação de serviços, em que o insolvente (A) era o prestador. Imagine-se que, por aplicação da al.b), a massa insolvente tem direito a exigir do contraente in bonis (B), por exemplo, 40.000 euros e que este, por aplicação da al.c), tem direito de exigir, como crédito sobre a insolvência, por exemplo, 60.000 euros. Se a recusa de cumprimento tiver causado a B danos suplementares no valor de 50.000 euros, por aplicação da al.d) do nº3 do art.102º, B terá o direito (adicional) a uma indemnização. Mas este, primeiro, apenas existe até ao valor imposto nos termos da al. b), ou seja, até 40.000 euros, e, segundo é abatido do quantitativo a que B tenha direito por força da alínea c), ou seja, deverá ser abatido aos 60.000 euros. Em conclusão, B terá direito a exigir apenas 60.000 euros- que é o montante a que já teria direito por força da aplicação da teoria da diferença – embora, muito provavelmente só venha a receber 20.000 euros, pois o mais provável é a massa declarar a compensação das obrigações, ao abrigo da al. e). Depois de superadas todas as dificuldades derivadas da redacção pouco clara da norma, assente em constantes remissões, percebe-se que o contraente do insolvente quase nunca terá direito à indemnização.É caso para perguntar: para que é que a lei atribuiu um direito se pretendia inviabilizar, na prática, o seu exercício? Tudo ponderado, teria sido mais eficaz (e mais simples) não prever regra alguma. Sendo, como se disse repetidamente, a recusa do administrador da insolvência um acto absolutamente lícito, a insusceptibilidade de indemnização dos danos suplementares decorreria dos princípios gerais da responsabilidade civil.” SERRA, Catarina (2018), “Lições de Direito da Insolvência”, Almedina, págs. 230 e 231
39 Em consonância com o art. 294ºCC “Os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei.”
40 Já a lei espanhola (Ley Concursal 22/2003, de 9 de julio) faz de igual forma esta ressalva no seu art.
61º/3.
contraparte resolver o negócio ou muito menos estabelecer uma indemnização (para esse efeito temos a norma geral do artigo 102º/3 CIRE) e no caso do arrendamento urbano para fins habitacionais o art. 108º/2 CIRE em que no caso de despejo por falta de pagamentos de alguma ou algumas das referidas rendas vencidas depois de transcorridos 60 dias sobre a declaração do AI, o senhorio pode exigir como crédito da insolvência uma indemnização até ao montante correspondente a um trimestre.
Por fim, através do art. 119º/3 CIRE conseguimos perceber que apesar do que é expresso nestes dois artigos, “(...) não obsta a que a situação de insolvência possa configurar justa causa de resolução ou de denúncia em atenção à natureza e conteúdo das prestações contratuais.”41. Referimo-nos, aqui, a situações em que a própria insolvência torna impossível a continuidade do negócio entre as partes42.
5. Contrato de Arrendamento Urbano
O Arrendamento ▇▇▇▇▇▇ revela um papel fundamental, tanto a nível económico como social, uma vez que permite um melhor aproveitamento e utilização do locado quer pelo senhorio quer pelo arrendatário e permite ao titular do direito de gozo obter um rendimento proveniente do arrendamento do mesmo, evitando assim a sua desvalorização e degradação, sem perder a titularidade do seu direito. Por outro lado, o arrendatário seja por falta de condições económicas ou por necessidades de outro cariz, pode gozar da utilização do locado mediante uma retribuição inferior à que teria de despender para o adquirir.
O Arrendamento constitui assim uma espécie de contrato de Locação previsto no art. 1022ºCC que estabelece que a locação “(...) é o contrato43 pelo qual uma das partes
41 O Ac. TRG de 10/07/2018, Processo: 1423/09.5 TBVCT-Q.61., estabelece que “IV- Assim, o nº 3 do art.119º é uma norma que requer uma apreciação da cláusula contratual em função da natureza do negócio e do conteúdo das obrigações deles emergentes: podendo as partes contraentes estabelecer que a situação de insolvência de um dos contraentes poderá constituir fundamento da resolução do contrato, tal cláusula contratual estará sempre sujeita à posterior ponderação da sua validade, em função da natureza do negócio e do conteúdo das prestações contratuais estipuladas”.
42 “Será, segundo o entendimento que temos por melhor, o que sucede, por exemplo, com relação a contratos bancários de abertura de crédito, seja o crédito aberto assegurado exclusivamente pelo banco concedente ou, como é frequente, mediante um esquema que contemple a possibilidade de recurso concursal ao mercado para obtenção de melhores ofertas.” ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2005), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, pág. 430
43 Acontece que nem sempre a relação locatícia resulta de um contrato, uma vez que é admitida a constituição de uma relação de arrendamento através de sentença judicial decorrente de um divórcio ou de cessação da união de facto. Para mais desenvolvimentos, vd. ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, pág. 9
se obriga a proporcionar a outrem o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição.”, sendo que pode ter como objeto tanto as coisas móveis (aluguer), como imóveis (arrendamento), art. 1023º CC. Neste sentido, podemos observar dois tipos de arrendamento, o rústico e o urbano, sendo que o nosso estudo centrar-se-á neste último, dividindo-se quanto à sua finalidade entre arrendamento habitacional e arrendamento não habitacional.
Da definição de locação sobressaem certos elementos fundamentais da relação arrendatícia, tais como a obrigação do senhorio proporcionar ao arrendatário o gozo do locado, o seu carácter temporário, e a retribuição que daí advém. A obrigação de proporcionar a outrem o gozo do locado é uma obrigação do locador 1031º/b) CC, na qual este deve assegurar o gozo da coisa para os fins a que se destina.
Aqui discute-se se existe uma obrigação do senhorio de conteúdo positivo (de estar continuamente a assegurar o gozo da coisa), ou de conteúdo negativo (de tolerar o gozo da coisa pelo arrendatário ou não perturbar esse gozo). Parece-nos claramente que, apesar de ser uma obrigação de conteúdo positivo, não cabe ao senhorio estar constantemente a assegurar o seu gozo, bastando apenas a este abster-se em praticar atos que impeçam ou diminuam o gozo da coisa pelo arrendatário (art. 1037º/1 CC).
Apesar do senhorio não ter a obrigatoriedade de assegurar o gozo contra atos de terceiros 1037/1 CC (in fine), deve manter a sua obrigação de realizar reparações ou outras despesas urgentes art. 1036º/1 CC, sendo que no caso de não cumprir, o arrendatário tem meios de reação ao seu dispor para tutelar esses direitos art. 1037º/2 CC.
Por outro lado, o carácter temporário do contrato revela-se fundamental e decorre do art. 1025ºCC, uma vez que não se pode celebrar um contrato de arrendamento por um período superior a 30 anos, sendo que na hipótese de o mesmo acontecer, este é reduzido até esse mesmo prazo44.
Por fim, temos a retribuição que se consubstancia numa contrapartida da cedência do gozo do locado pelo senhorio e que tem, como objeto, uma prestação pecuniária periódica que deve ser determinada ou fixada no contrato (art.1075º/1 CC).
44 Devemos distinguir o prazo e a duração do contrato, visto que a duração do contrato pode ser superior no caso de o contrato de locação seja alvo de sucessivas renovações art. 1054ºCC, (ou melhor se diria prorrogações, uma vez que se trata de um mesmo contrato cujo seu termo final é alterado), a este propósito, veja-se o Ac. STJ de 19/09/2017, Processo: 5801/12.4 YYLSB-A.S1
6. Insolvência do Arrendatário
O art. 108º CIRE aplica-se a casos em que o arrendatário se encontra numa situação de insolvência, ou seja, impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas. Apesar do artigo usar indistintamente o termo locação englobando os casos de arrendamento e aluguer e referir locador e locatário, iremos ser mais concretos usando os termos aos quais os preceitos se aplicam, arrendamento não habitacional e habitacional,
senhorio e arrendatário.
Os nos 1 e 3 do art. 108º do CIRE aplicar-se-ão ao arrendamento para fins não habitacionais e ainda ao regime do aluguer que não trataremos aqui por não se incluir no tema deste trabalho.
Por outro lado, o nº2 vai se ocupar exclusivamente do arrendamento para fins habitacionais do insolvente com as preocupações especiais que emergem neste tipo de contrato.
Por fim, os números 4 e 5 aplicar-se-ão indistintamente ao arrendamento para fins não habitacionais e habitacionais.
6.1. Arrendamento para Fins Não Habitacionais
Embora não haja nenhuma noção legal45 de arrendamento para fins não habitacionais e de se incluir no regime locativo, não restam dúvidas que se aplica a locados com uma finalidade comercial e industrial sendo que podemos encontrar o seu regime jurídico nos arts. 1108º a 1113º do CC.
Em termos práticos, podem surgir várias consequências no caso de um senhorio que se depare com a contingência do arrendatário com quem tenha celebrado um contrato para fins não habitacionais ser declarado insolvente, como é o caso de não receber rendas em dívida, fruto de estas serem classificadas como dívidas da insolvência e não da massa (se o AI denunciar o contrato), e ainda o facto de não recuperar rapidamente o locado, o que não permite uma nova aplicação e consequente rentabilização do mesmo.
Não nos poderemos olvidar ainda daquelas situações em que o senhorio recorreu a crédito bancário para adquirir o locado arrendado e em que os rendimentos advindos do
45 Antigamente, no art.110º do RAU encontrávamos a definição de arrendamento para fins não habitacionais “Considera-se realizado para comércio ou indústria o arrendamento de prédios ou partes de prédios urbanos ou rústicos tomados para fins directamente relacionados com uma actividade comercial ou industrial.”
pagamento da renda pelo arrendatário seriam para financiar a dívida contraída pelo empréstimo. O senhorio que não tenha meios alternativos para suprir a falta do pagamento das rendas, será “obrigado” a não cumprir o estabelecido com o seu credor, que normalmente será um banco e que irá sempre receber o pagamento da sua dívida (nem que seja através da hipoteca do locado), sendo que o mesmo não acontecerá com as rendas devidas pelo arrendatário em que não existe uma garantia do seu pagamento.46
Por outro lado, temos o reverso da moeda, uma vez que estamos perante um arrendatário sem capacidade financeira para cumprir as suas obrigações vencidas e que a acrescentar a isto vê o seu passivo a aumentar e a sua margem de maneio condicionada pela ação do AI.
Posto isto, e ao analisarmos cuidadosamente o art. 108º/1 CIRE verificamos que a declaração de insolvência não suspende47 o contrato de locação em que o arrendatário48 é o insolvente, desviando-se assim do “suposto” princípio geral do art. 102ºCIRE em que o contrato fica suspenso até que o AI decida o seu destino.
O Arrendamento Urbano é um contrato temporário de execução duradoura, e assim sendo, não podemos conceber uma situação em que o senhorio não proporciona o gozo do locado de forma contínua, nem a situação em que o locatário não paga a renda de forma periódica49.
O facto de se tratar de um contrato de execução duradoura em que o senhorio se predispõe a entregar o locado ao arrendatário e este ao pagamento de uma retribuição, permite compreender a razão subjacente ao facto de a declaração de insolvência não suspender o contrato de arrendamento urbano. Imaginemos só que o contrato se suspenderia, o facto de o senhorio insolvente deixar de receber rendas levaria a um grande constrangimento, uma vez que as rendas consubstanciam uma importante fonte de
46 ▇.▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ (2012), “A Insolvência do arrendatário e os efeitos desta sobre o contrato de arrendamento e sobre as rendas”, Confidencial Imobiliário, Newsletter Imobiliário Portuguesa, Fevereiro, págs. 38 e 39
47 Podemos verificar que a Lei Espanhola (Ley Concursal 22/2003, de 9 de julio) no seu art.61º/2, explica de igual forma que a declaração de insolvência não afetará o cumprimento dos contratos mantendo as obrigações recíprocas das partes, prezando assim pela não suspensão.
48 A Lei Brasileira nº 11.101, de 9 de Fevereiro de 2005, não faz uma distinção entre a locação em que o locatário é insolvente ou em que o locador é insolvente afirmando apenas no seu art. 119º/VII que “a falência do locador não resolve o contrato de locação e, na falência do locatário, o administrador judicial pode, a qualquer tempo, denunciar o contrato”, não havendo aqui a distinção de o imóvel se destinar à habitação como é sensibilizado pelo art.108º/2, e na qual o administrador da insolvência não pode denunciar o contrato.
49 Para mais desenvolvimentos sobre as características qualificativas do contrato de arrendamento urbano vd., ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina págs. 43 a 48
rendimento para o abatimento das dívidas da massa e da própria insolvência. Por outro lado, no caso do arrendatário, seria prejudicial e penoso para este, uma vez que teria de restituir o bem, o que no arrendamento seria complicado visto que arrendar outro locado se tornaria muito difícil fruto da situação económica deficitária em que se encontraria. A solução mais equitativa será assim a continuidade do contrato de Arrendamento Urbano. Na génese do artigo 108º CIRE está o art. 169º do CPEREF com relativas diferenças, visto que o preceito anterior regulava apenas o arrendamento, enquanto que o artigo atual é mais abrangente, referindo-se ao contrato de locação. Para além disto, o artigo atual refere-se à suspensão e não suspensão, enquanto que o CPEREF colocava a
questão com referência à cessação ou não cessação do contrato.
Apesar da suspensão estabelecida no art. 108º/1, o AI pode denunciar50 o contrato para fins não habitacionais tendo em conta a decisão que for mais conveniente para os interesses da massa insolvente. A denúncia do contrato deve ser realizada com um pré- aviso de 60 dias se nos termos da lei ou do contrato não for exigido um pré-aviso inferior. Nos termos da lei a denúncia do contrato para fins não habitacionais do art. 1110º
CC remete para o disposto no arrendamento para fim habitacional art.1097º CC e dependerá da duração do contrato, sendo que o limite de tempo serão os 60 dias do preceito, mas caso o contrato tenha a duração inicial de um prazo inferior a seis meses, o prazo reduz-se para um terço.
Por outro lado, o contrato pode não ser omisso quanto ao pré-aviso e estabelecer outro prazo, prazo esse que deve ser respeitado (se for inferior).
O artigo em apreço, não refere, porém, como se deve proceder essa denúncia, pelo que deve ser tido em conta o art. 9º NRAU que entrou em vigor em 27/02/200651. A comunicação entre as partes deve assim ser realizada por escrito, assinada pelo declarante e remetida por carta registada com aviso de receção para o local arrendado52. No caso de
50 “Essa “denúncia do contrato” constitui no entanto, em bom rigor, uma recusa do seu cumprimento, na medida em que constitui a outra parte no direito a receber, como crédito sobre a insolvência, as rendas ou alugueres correspondentes ao período intercedente entre a data da produção dos seus efeitos e o fim do prazo contratual estipulado, ou a data, para a qual de outro modo, teria sido possível a denuncia pelo insolvente.” ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ de Menezes (2018), “Direito da Insolvência”, 8ª Edição, Almedina, pág. 200
51 A data é extremamente importante uma vez que a denúncia deve reger-se pela lei vigente ao tempo dela.
52 Exigências essas que foram descuradas pelo administrador de insolvência no Ac. TRC de 8/11/2016, Processo 1622/10.7TBACB-H.C2, e que levaram à invalidade da denúncia do contrato de locação levando a que as rendas fossem pagas até à restituição do locado (art.1045º/1 CC), sendo que a ocupação legítima a pretensão do pagamento das rendas.
estas formalidades não serem respeitadas, a sanção é a nulidade (art. 220º CC) da denúncia por parte do AI e consequentemente a continuação do contrato.
Importa, neste sentido, salientar que caso o AI denuncie validamente o contrato de arrendamento para fins não habitacionais, o arrendatário deve entregar o locado logo que finde o contrato, uma vez que se a coisa locada não for restituída por qualquer causa, o arrendatário é obrigado a pagar a renda estipulada a título de indemnização até esse momento53, exceto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida (art.1045º/1). Para além disto, no momento em que se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro(art.1045º/2)54.
No caso de se tratar de um arrendamento para fins não habitacionais, o AI pode denunciar o contrato, e neste sentido, torna-se impreterível fazer uma ponte entre o explicitado no art. 108º/1 CIRE e o art.108º/3 CIRE em que o insolvente fica obrigado ao pagamento, como créditos sobre a insolvência a pagar ao senhorio, as retribuições correspondentes “ao período intercedente entre a data de produção dos seus efeitos e a do fim do prazo contratual estipulado, ou a data para a qual de outro modo teria sido possível a denúncia pelo insolvente, deduzidas dos custos inerentes à prestação do locador por esse período55, bem como dos ganhos obtidos através de uma aplicação alternativa do locado56, desde que imputáveis à antecipação do fim do contrato, com a actualização de todas as quantias, nos termos do nº2 do artigo 91º, para a data de produção dos efeitos da denúncia.”
Na prática, o senhorio terá direito a receber as retribuições que correspondem ao período meado entre a data dos efeitos da denúncia do contrato pelo AI, e a do fim do
53 Segundo o Ac. TRL de 08/5/2012, Processo 17663/10.1YYLSB-A.L1-7, “Assim sendo, findo o contrato de arrendamento, sem que a coisa locada tenha sido entregue ao locador, não podemos falar em rendas vencidas, porque só há rendas se houver contrato de arrendamento. Do que se trata é apenas de um direito de indemnização do locador, pela ocupação indevida do espaço por parte do ex-locatário, com o consequente atraso na entrega do locado ao senhorio, e a que a lei concede relevância para efeitos de equilíbrio de prestações entre as partes envolvidas. Esse equilíbrio encontra uma melhor expressão indemnizatória na referência à renda que vigorava entre as partes até ao momento da cessação do contrato de arrendamento.”
54 De acordo com o art.810º CC, as partes podem fixar por acordo entre partes o montante da indemnização exigível, ao qual se designa por cláusula penal.
55 Esta dedução explica-se pelo facto de o locador ter deixado de suportar os custos após os efeitos da denúncia.
56 É natural que no caso de o locador arranjar outro locatário, esses ganhos serão deduzidos do valor a pagar pelo antigo locatário uma vez que não se pretende que haja uma dupla compensação do locador.
contrato, ou a data em que, de outra forma, seria possível a denúncia do contrato pelo arrendatário. Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado por um período de cinco anos e o arrendatário não pode denunciar o contrato com antecedência inferior a um ano (art.1110º/2 CC).57
Podia surgir aqui a dúvida quanto à possibilidade de se considerar estas retribuições como sendo créditos sobre a insolvência, uma vez que se analisarmos o disposto do art. 51º/1/e) CIRE devem ser consideradas dívidas da massa (as dívidas resultantes de contrato bilateral, e que dizem respeito ao período posterior ao da declaração de insolvência, e o cumprimento não pode ser recusado pelo AI), sendo que no caso estamos em face de um contrato bilateral, posterior à declaração de insolvência, e o cumprimento não pode ser recusado (apenas pode haver denúncia). Acontece que apesar disto, a letra de lei do art 51º/1 CIRE refere, “[s]alvo preceito expresso em contrário (...)”, o que é o caso, daí considerarmos que são dívidas da insolvência.
Na parte final do art. 108º/3 CIRE quando lemos “com a actualização de todas as quantias, nos termos do nº2 do artigo 91º, para a data de produção dos efeitos da denúncia.”, o legislador pretendeu assim evitar o benefício desmesurado do credor por juros superiores decorrentes do vencimento antecipado do seu crédito. Referimo-nos aqui ao instituto do «interusurium», em que o credor lança mão de tal antecipação do cumprimento da obrigação, tendo assim o direito de exigir ao devedor os frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação, o que não acontece nestes casos58.
6.2. Arrendamento para Fins Habitacionais
O art. 108º/2 CIRE vem regular os casos em que o locado se destina à habitação do insolvente, ou seja, é a base da sua vida pessoal e familiar, e que merece, portanto, uma proteção especial.59
57 In, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, pág. 177
58 Vd. Ac. STJ de 31/01/2017, Processo: 519/10.5TYLSB-CE.L1.S1 “VI - O problema do interusurium gerado pela antecipação do vencimento das obrigações do insolvente é resolvido pela lei – o art. 91, nº 2, do CIRE – ao não reconhecer ao credor o direito aos rendimentos correspondentes ao período da antecipação.”
59 Para mais desenvolvimentos sobre os efeitos da declaração de insolvência no contrato de arrendamento no ordenamento jurídico espanhol Vd., PASTOR, Nuria Pastor (2013), “Efectos de la Declarácion de Concurso em el Contrato de Arrendamiento*” Revista Internauta de Pràctica Jurídica, Núm. 30, págs. 27 a 39
Uma das grandes “novidades” passa pela limitação imposta ao AI60, uma vez que, e contrariamente ao que acontecia no nº1 do art. 108 CIRE, este (de forma a proteger o arrendatário) não poderá denunciar o contrato, mas apenas declarar que o direito ao pagamento de rendas vencidas depois de transcorridos 60 dias sobre tal declaração, não será exercível no processo de insolvência.
Ao fazer referência a rendas vencidas após a declaração de insolvência, o artigo torna percetível que a suspensão do contrato também não ocorrerá.
Não se pode descurar o facto de não ser percetível o regime dos créditos referentes às rendas devidas pelos 60 dias ou menos que decorrerão após a declaração do AI sobre a impossibilidade de exercício no processo de insolvência do direito às rendas vencidas. Podíamos considerar, uma vez mais, estes créditos como sendo da insolvência uma vez que as indemnizações dos prejuízos sofridos em caso de despejo são assim consideradas. Acontece que devemos ter em conta o disposto no art. 51º/1/e) CIRE que estabelece que são dívidas da massa insolvente quaisquer dívidas resultantes de contrato bilateral (contrato de arrendamento), cujo cumprimento não possa ser recusado pelo administrador da insolvência (só pode denunciar o contrato o AI), e posterior à declaração de insolvência. Assim sendo, parece fazer sentido considerar estes créditos como dívidas da massa61. No caso de o AI não emitir a declaração prevista no art. 108º/2 CIRE, parece- nos igualmente que devem ser considerados créditos sobre a massa.
Todas as ações relativas às dividas da massa insolvente correm por apenso ao processo de insolvência (art.89º/2)62.
Em caso de despejo por falta de pagamentos de alguma ou algumas das referidas rendas vencidas depois de transcorridos 60 dias sobre a declaração do AI, o senhorio pode exigir como crédito da insolvência uma indemnização até ao montante correspondente a um trimestre.
Esta indemnização surge assim como uma espécie de “compensação” para com o senhorio, decorrente da possibilidade de o AI poder declarar que o pagamento das rendas
60 Denota-se claramente um esvaziamento dos poderes por parte do AI, que se encontrava “fortificado”
nos arts. 102º e 108º/1 CIRE e que agora apenas pode fazer esta declaração.
61 Neste sentido, ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Um Curso de Direito da Insolvência”, 2ª
Edição revista e atualizada, Almedina, págs. 201 e 202
62 Segundo o Ac. TRP, de 03/05/2011, Processo 2158/07.9TJPRT-B.P1 “IV-Assim, as rendas em dívida desde a data da declaração de insolvência terão que ser exigidas ao abrigo do disposto no 89º/2 CIRE em ação que corre por apenso ao processo de insolvência”. De igual forma veja-se o Ac. TRC de 23/06/2015, Processo 1622/10.7TBACB-H.C1, “A ação intentada pelo senhorio com vista à cobrança dessas rendas corre por apenso ao processo de insolvência, nos termos do art. 89º, nº2 (e não do art.146º), do mesmo diploma legal.”
vencidas serem dívidas da insolvência. Acontece que, tanto os créditos como as indemnizações sobre a insolvência são pagos depois de satisfeitas as dívidas da massa (havendo aqui um sério risco de não haver créditos suficientes para suprir essas dívidas), daí questionarmos de que vale ao senhorio (na teoria) ficar “rico” em créditos e indemnizações deste cariz e (na prática) “pobre” em liquidez.
6.3. Impedimentos à resolução do Contrato de Arrendamento Urbano
De forma a proteger o arrendatário o art.108º/4 CIRE elenca as situações em que não é permitido a resolução do contrato após a declaração de insolvência deste.
Através da análise da alínea a) do art. 108º do CIRE é percetível que não é permitido a resolução do contrato de arrendamento habitacional e não habitacional63 com base na falta de pagamento de rendas respeitantes ao período anterior à data da declaração de insolvência.
Esta norma pode ser entendida no sentido de o senhorio, ao não exercer a resolução do contrato antes da declaração de insolvência, vir assim, depois, a perder esse direito, até porque caso fosse permitido a resolução, este ficaria numa situação mais favorável do que a dos demais credores64.
Neste sentido, não acompanhamos assim a ideia de MENEZES LEITÃO65 ao considerar “(...) criticável a solução prevista no art. 108º, nº 4 a) de excluir a faculdade de resolução do senhorio por falta de pagamento de rendas e alugueres anteriores, que o obriga a manter vigente um contrato que, nos termos legais, tinha todos os fundamentos para resolver, sem que tal alterasse a qualificação desses créditos como créditos da insolvência.”
Por outro lado, caso se dê a falta de pagamento de uma das rendas depois da declaração de insolvência já será facultada ao senhorio a possibilidade de resolver o contrato de arrendamento devendo, nesse caso, dirigir-se ao AI.
63 Defendendo a aplicação desta alínea apenas ao arrendamentos para fins não habitacionais, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, 2005, pág. 411 nota:7
64 De igual forma, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇.▇▇▇▇▇▇▇▇ / ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ (2005), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, Vol. I, Artigos 1.º a 184.º, Quid Juris, pág. 411 nota:7
65 Vd. ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2018), “Direito da Insolvência”, 8ª Edição, Almedina, pág. 201
Nestes casos, pode ser requerida ação de despejo (art. 14º NRAU) que reveste a natureza de ação autónoma, mas por força da própria declaração de insolvência do arrendatário integra um incidente do respetivo processo passando a inserir-se de forma dependente nos próprios trâmites do processo de insolvência66.
Outra questão passa por saber se a falta de pagamento de uma única renda após a declaração de insolvência é fundamento suficiente para a resolução do contrato (no caso de o insolvente ter até aí cumprido escrupulosamente o pagamento das rendas). O art. 1083º/3 CC considera que “É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda”, o que não significa que só a partir do não pagamento de 3 meses de renda é que o senhorio possa lançar mão da ação de despejo. De forma a ajudar a estabelecer um critério decisório, é essencial observar o preceito do art. 1083º/2 CC, “[é] fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequência torne, inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento (...)”. Teremos assim que fazer uma avaliação casuística do caso e verificar as consequências que o não pagamento de apenas uma renda, se pela sua “gravidade e consequência”, justifica ou não uma ação de despejo67.
No caso de o contrato de arrendamento estabelecer a existência de um fiador (art. 627º CC), este deve ser interpelado, já que assumirá solidariamente com o arrendatário o cumprimento de todas as obrigações decorrentes do contrato de arrendamento, ou seja, as obrigações antes e depois da declaração de insolvência.
Por fim, a alínea b) não permite a resolução do contrato após a declaração de insolvência com base na deterioração da situação financeira do arrendatário, confirmando assim aquilo que já vinha sido propugnado pelo art. 119º/2 CIRE, em que a situação de insolvência não pode consubstanciar uma condição resolutiva do negócio, já que, não é pelo arrendatário estar numa situação económica deficitária que o senhorio terá direito a resolver o contrato. Encontrámo-nos assim, perante uma norma que confere uma maior proteção ao arrendatário uma vez que o senhorio pode ter a “certeza” de que a situação deste não irá permitir o pagamento das futuras rendas e mesmo assim encontra-se de “mão
66 Sobre a ação de despejo no processo de insolvência, Ac. TRP, de 03/05/2011, Processo 2158/07.9TJPRT-B.P1
67 Neste sentido, Ac. TRP, de 08/04/2010, Processo 2715/08.6TBVCD.P, “No caso em análise estava em dívida à data da propositura desta acção (26.09.2008) uma renda de € 1 048,53, que se vencera em 01.09.2008.Não sabemos a situação económica dos AA. para aferir se esse rendimento lhes era muito ou pouco necessário, mas o valor da renda, só por si, permite concluir, objectivamente, pela gravidade da falta. Por isso, é de decretar a resolução do contrato e o consequente despejo.”
atadas” no que diz respeito à antecipação da resolução do contrato, tendo de aguardar que esse incumprimento se efetive.
6.4. Locado ainda não entregue ao Arrendatário
O arrendamento urbano trata-se de um contrato consensual, ou seja, constitui-se antes da entrega da coisa locada, sendo que o art. 1022ºCC dá a noção de locação e não inclui a entrega como sendo um elemento necessário à realização do contrato (daí não ser um contrato quoad constitutionem), sendo que essa mesma entrega é uma obrigação do senhorio art. 1031º/a) CC.
O Código Civil nada diz relativamente à entrega do locado no que ao arrendamento urbano diz respeito uma vez que o senhorio responde sempre por vícios na coisa locada que datem do momento da entrega, isto é, se não provar que os desconhecia sem culpa 1032º/b) CC, ou que os defeitos eram conhecidos ou cognoscíveis pelo arrendatário 1033º/b) e c) CC.
A entrega do imóvel pode ser material ou simbólica de acordo com o art. 1263º CC, sendo que a tradição das chaves (traditio clavium) revela-se mais comum e pode ser realizada pelo senhorio ou por terceiro instruído por este (entrega indireta), e não havendo disposição específica, deve ser realizada no lugar onde se encontra o imóvel, sendo que se afigura como possível a (traditio brevi manu) naqueles casos em que o arrendatário detendo o imóvel em comodato acorda com o senhorio a passagem ao arrendatário por mero consenso.
Uma questão que gera um certo debate na doutrina é a admissibilidade da entrega por constituto possessório no arrendamento, artgs. 1263º/c) e 1264º CC. Admitindo esta possibilidade no que tendemos a acompanhar, DAVID MAGALHÃES68 relativamente aos casos em que o arrendatário anterior mantém sempre o domínio fático do imóvel e o atual arrendatário acaba por o subarrendar (art. 1264º/2 CC).
▇▇▇▇▇ FURTADO69 defende que o constituto possessório não se pode verificar no arrendamento, uma vez que, “por seu intermédio a detenção material persiste no tradens, ao passo que a entrega tem de a fazer passar necessariamente ao accipiens (o locatário)”
68 In, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ (2009), “A resolução do contrato de arrendamento urbano”, Coimbra
Editora, pág.173
69 In, ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ (2009), “Manual de Arrendamento Urbano”, Vol. I,
4ª Edição, Almedina, págs. 487 e 488
Posto isto, o art. 108º/5 CIRE que corresponde ao antigo art. 169º n.os 3 e 4 do CPEREF70 confere ao AI e ao senhorio a faculdade de resolver o contrato no caso de o locado ainda não ter sido entregue ao arrendatário à data da declaração de insolvência deste, sendo ainda lícito a qualquer um deles fixar ao outro um prazo razoável para o efeito, findo o qual cessa o direito de resolução71. Esta solução acaba por ser idónea a evitar um problema, uma vez que ainda não existe no arrendamento a efetiva habitação do locado, daí a resolução do contrato ter menos consequências do que se o arrendatário já estivesse a habitar o imóvel, tudo se passando como se não tivesse alguma vez existido contrato72.
No caso de termos um contrato de arrendamento resolvido por vontade do AI, podemos questionar se no caso de se qualificar a insolvência como culposa não deveríamos admitir uma indemnização a favor do senhorio pelo interesse contratual negativo, ou seja, e nas palavras de ALMEIDA COSTA73 “(...) a indemnização do dano negativo tende a repor o lesado na situação em que estaria se não houvesse celebrado o contrato, ou mesmo iniciado as negociações com vista à respectiva conclusão”.
O facto de se tratar de uma insolvência culposa74 em que o devedor criou ou agravou a sua situação em resultado da sua atuação art. 186º/1 CIRE, leva a que ponderemos aqui a existência de uma indemnização no caso do senhorio perder a oportunidade de arrendar o locado a outra pessoa (e assim o pagamento das rendas que daí adviriam). A perda de que falamos devia ser efetivamente provada e a indemnização seria um crédito sobre a insolvência à semelhança do que acontecia no antigo art. 169º/3
70 No plano substancial, o art. 108º/5 não atribui às partes do contrato a indemnização prevista nº3 do referido art.º 169.º do CPEREF no caso de resolução.
71 “4. No caso de não haver entrega da coisa locada à data de declaração de insolvência, o nº5 deste artigo admite uma livre resolução do contrato por ambas as partes, cujos efeitos não são esclarecidos. Não se compreende designadamente como se articula esta resolução com a opção do administrador da insolvência entre a execução e a recusa do cumprimento do contrato, prevista no art. 102º. Salienta-se, porém, a prevalência deste art. 108º sobre aquela disposição.” ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2018), “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”, Anotado, 10º Edição, Almedina, pág.185 72“Os arts. 108º/5 e 109º/2 preveem a resolução da locação em que o insolvente é parte, se a coisa não
foi entregue ainda ao locatário. É um caso particular, que se baseia na de bom senso que, se a locação ainda se não exerce faticamente, é melhor evitar que a coisa entre nas agruras que a relação duradoura provoca (pode a solução ser estar também influenciada pela consideração do arrendamento como um contrato real quod constitutionem, para a qual tendemos). Não impede que se entenda haver aqui uma verdadeira resolução do contrato de locação, que surge como profilática da relação duradoura de locação.” ASCENSÃO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág. 299
73 Vd. ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2018), “Direito das Obrigações”, 12ª Edição, Almedina, pág. 548
74 Vd. ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Um Curso de Direito da Insolvência”, 2ª Edição revista e atualizada, Almedina, pág. 403 e ss.
do CPEREF. Este prejuízo para o senhorio deveria ser acautelado de forma a que haja uma maior ponderação relativamente à recusa do cumprimento do contrato.
Anteriormente, referimo-nos a uma situação hipotética em que o insolvente era o arrendatário, acontece que neste caso a situação inverte-se, e é o próprio senhorio que passa a encontrar-se numa situação de insolvência, ou seja, impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.
Este artigo, contrariamente ao 108º CIRE (que faz a distinção), vai-se aplicar indiscriminadamente ao arrendamento para fins habitacionais e não habitacionais.75 A não individualização relativa a um preceito habitacional passa pelo simples facto de o arrendatário já se encontrar protegido uma vez que o AI apenas pode denunciar o contrato no caso de o locado ainda não ter sido entregue.
A redação atual do art. 109º CIRE corresponderia ao artigo art. 170º CPEREF com algumas particularidades relevantes, já que o artigo anterior previa o arrendamento e não os casos do aluguer, e apenas regulava o exercício do direito de resolução pelo liquidatário judicial no seu nº1 e os direitos do arrendatário no caso de alienação do local arrendado no nº2.
O art.109º/1 CIRE repete em parte o que foi dito no art. 108º/1 CIRE no qual a declaração de insolvência por si só não suspende76 o contrato de arrendamento em que o insolvente seja o senhorio, ou seja, o contrato cumpre-se como se nada tivesse ocorrido, estando o senhorio naturalmente obrigado a assegurar o gozo do locado para os fins a que se destina ( art. 1031º/b CC).
Nesta situação a denúncia por qualquer das partes apenas é possível para o fim do prazo em curso77, sem prejuízo dos casos de renovação obrigatória (art. 109º/1 in fine CIRE). Acontece que a renovação obrigatória foi abolida pelo NRAU, ou seja, esta exceção só se poderá aplicar a contratos que se enquadrem no regime transitório dos arts.
75 Contrariamente, aplicando esta solução apenas ao arrendamento habitacional, vd. ▇▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇
▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇ (2005), “Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso”, ROA, Ano 65 - Vol. II, pág. 292
76 Há todo o interesse em manter o contrato uma vez que as rendas recebidas pelo arrendatário permitem fazer face às despesas da massa e da insolvência.
77 Imaginemos que estamos perante um contrato de arrendamento de 5 anos e a insolvência do senhorio acontece no 3º ano do contrato. O contrato será cumprido inteiramente até terminar o seu prazo, e aí é que poderá haver a denúncia por uma das partes, ou caso seja benéfico para a massa a continuidade da relação arrendatícia e o arrendatário assim o desejar, o contrato renova-se.
26º e ss. NRAU, sendo que no resto dos casos o próprio AI pode denunciar o contrato no fim normal do prazo, sem que a isso o arrendatário possa obstar.
Por outro lado, o art. 109º/2 CIRE enfatiza o que o art. 108º/5 CIRE já preceituava com as devidas adaptações, sendo que, se o imóvel não tiver sido entregue ao arrendatário à data da declaração de insolvência, tanto o administrador da insolvência como o arrendatário podem resolver o contrato, sendo lícito a qualquer um deles fixar ao outro um prazo razoável para o efeito findo o qual cessa o direito de resolução (remetemos assim a explicação deste preceito para o exposto relativamente ao art. 108º/5 CIRE).
O AI neste artigo vê-se despojado dos poderes e da importância que lhe vinha sendo conferida tanto no art. 102º como no art. 108º CIRE, podendo este apenas resolver o contrato caso o locado não tenha sido entregue ao arrendatário. Parece-nos que o facto de o AI não poder denunciar o contrato apenas poderia ser criticado numa situação em que o senhorio está insolvente e a renda praticada é extremamente baixa (o que não permite uma maximização da massa), mas mesmo neste caso o que defendemos não seria uma denúncia do contrato já que os interesses do arrendatário também devem ser precavidos, mas uma atualização da renda com as devidas especificações consoante se trate de um arrendamento para fins habitacionais arts. 30º e ss. NRAU ou para fins não habitacionais arts. 50º e ss. NRAU.78
7.2. Reconhecimento dado ao arrendatário dos direitos conferidos pela Lei Civil
7.2.1. Transmissão da Posição Contratual
O art. 109º termina o seu nº3 estipulando aquilo que o art. 170º/2 do CPEREF já preceituava ,ou seja, que a alienação da coisa locada no processo de insolvência não priva o arrendatário dos direitos que lhe são reconhecidos pela lei civil, isto é, a transmissão da posição contratual do locador (art. 1057ºCC) e o direito de preferência (art. 1091ºCC).
O Arrendamento Urbano é um contrato de execução duradoura e, como tal, não é necessário a extinção do contrato para dar lugar a constituição de uma nova relação. Para isso temos a transmissão da posição contratual, que pode ser realizada inter vivos
78 Neste sentido, veja-se como se procede a alteração da atualização das rendas consoante o tipo de arrendamento, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, págs. 190 a 200
(transmissão da posição do locador 1056º CC e divórcio 1105º CC) e mortis causa (pela via sucessória 1106º CC).
Através do art. 424º CC podemos observar que qualquer das partes tem a faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual desde que o outro contraente, antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão. MOTA PINTO79 refere neste caso a necessidade de três declarações de vontade, no entanto, não podemos aplicar esta situação à transmissão da posição contratual do locador, uma vez que não se afigura como sendo necessário o consentimento do arrendatário para a transmissão do direito, sendo apenas necessário as declarações de vontade do senhorio e do adquirente.
A transmissão do locado a terceiro pelo senhorio conduz a que o arrendatário se questione acerca da manutenção ou extinção do contrato de arrendamento. O locador que adquirir o direito com base no contrato que foi celebrado, sucede nos direitos e obrigações do anterior locador, sem prejuízo das regras de registo (art. 1057º CC). Referimo-nos aqui ao princípio emptio non tollit locatum 80 ,isto é, a compra não afeta a locação, uma vez que o adquirente sucede ex lege na posição do senhorio, havendo uma sub-rogação legal81 no contrato e a situação jurídica de que o arrendatário é titular mantém-se intocável82 de forma a assegurar estabilidade à relação de uso ou fruição originada pelo contrato arrendatício.
O adquirente que vai substituir o senhorio na relação de arrendamento mantém os direitos e deveres do anterior senhorio, ou seja, o conteúdo do respetivo contrato mantém- se, mudando apenas a pessoa que recebe as rendas e que deve realizar as devidas reparações no locado. Neste sentido devemos ter presente que as obrigações do adquirente são apenas relativas à execução futura do contrato, não lhe sendo atribuídos os direitos e deveres anteriores à transmissão (que só ocorreria na possibilidade de ter havido em simultâneo uma cessão de créditos de rendas vencidas).
Por outro lado, temos o art. 824º/2 “Venda em execução”, no qual é possível verificar que os “(...) bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os
79 ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇ (2003), “Cessão da Posição Contratual”, Reimpressão, Almedina, págs. 71 e 72
80 Neste sentido existem várias construções creditícias de forma a explicar a transmissão da posição contratual do locador, entre elas, a cessão da posição contratual, a cessão de créditos, a sub-rogação, e a transmissão singular de dívidas, por não ser o objeto primacial deste trabalho remetemos para a explicação de MENEZES CORDEIRO, ▇▇▇▇▇▇▇, “Da Natureza do Direito do Locatário”, in ▇▇▇▇▇://▇▇▇▇▇▇.▇▇.▇▇/▇▇▇/%▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇-▇▇▇▇-▇▇▇▇-▇▇▇▇-▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇▇%▇▇.▇▇▇.
81 ▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇ (2003), “Cessão da Posição Contratual”, Reimpressão, Almedina, pág. 81
82 Vd. ▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ (2018), “Código Civil”, Anotado, 20ª Edição actualizada, Ediforum, pág. 1002 nota:7
onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com excepção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente do registo.”.
No confronto desta norma com a da transmissão da posição do locador (art. 1057º CC) questiona-se se o adquirente é ou não obrigado a respeitar o contrato de arrendamento constituído pelo anterior locador.
Primeiramente, neste sentido devemos tratar a qualificação jurídica da posição do arrendatário, sendo que para uns o direito de gozo da coisa locada é um direito real menor e, neste sentido, o direito tem uma ligação ao locado e não à pessoa, e assim sendo a venda do imóvel em processo de execução determina a sua extinção, como ónus, nos termos do citado 824º/2 CC. Em sentido contrário, a doutrina maioritária considera o direito do arrendatário um direito pessoal de ▇▇▇▇, isto é, o direito está intrinsecamente ligado à posição do arrendatário enquanto parte numa relação obrigacional, e assim o contrato não caduca, sendo oponível ao adquirente nos termos do art.1057º CC.83
Tendemos a considerar que o art. 824º/2 CC se refere a direitos de garantia e outros direitos reais não abrangendo neste caso o arrendamento84 que terá natureza obrigacional e como afirma ABILIO NETO85 “3. II- (...) não se aplica, nem direta nem analogicamente, a situações de arrendamento, desde logo porque não há nenhuma lacuna a integrar, visto que esse normativo não prevê a caducidade do arrendamento com a venda executiva, cujo regime de transmissão está regulado no art. 1057.º do CC.”.
Na possibilidade de o imóvel ser apreendido (penhorado ou arrestado) teremos de verificar se a relação de arrendamento foi constituída antes ou depois. Nas situações em que o contrato de arrendamento foi constituído antes do imóvel ser apreendido torna-se fulcral aferir se o dar de arrendamento um imóvel implica uma significativa desvalorização do locado86. Tendemos a considerar que o facto de o senhorio não poder usar o imóvel, já que sobre este incide um contrato de arrendamento, e poder retirar uma
83 Para mais desenvolvimentos relativos á natureza do direito do arrendatário, vd. ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, págs. 44 a 47
84 Neste sentido, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, pág. 118, “(...) o arrendamento não se encontra incluído nos direitos que caducam com essa venda, nos termos do art.824º/2, bem como na alienação em processo de insolvência, face ao que dispõe no art.109º CIRE.”
85 In, ▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇ (2018), “Código Civil”, Anotado, 20ª Edição actualizada, Ediforum, pág. 1002
86 Veja-se, Ac. STJ, de 27/11/2018, Processo 1268/16.6T8FAR.E1.S2, “I - No actual contexto, o arrendamento de um imóvel não constitui, sem mais, um factor de desvalorização do mesmo, nem constitui um obstáculo à satisfação integral do crédito garantido.”
contrapartida superior pelo uso de outro arrendatário, não constitui per si, um fator de desvalorização e, neste sentido, o contrato deve manter-se.
Inversamente, se estivermos perante uma relação arrendatícia que foi constituída após o registo da hipoteca, arresto ou penhora, esta é inoponível ao adquirente do locado em sede de venda judicial uma vez que caduca automaticamente87. Neste caso deverão prevalecer os interesses do credor hipotecário em detrimento dos interesses do arrendatário uma vez que este tinha sempre a possibilidade aquando da celebração do contrato, de saber, socorrendo-se do registo, que o imóvel objeto do arrendamento estava hipotecado (sendo certo que poderá ainda exercer o seu direito de preferência na venda judicial).
No caso de o arrendatário continuar a ocupar o imóvel após a extinção do contrato, estamos perante a violação do direito de propriedade do adquirente que pode levar a que aquele fique sujeito ao pagamento de uma indemnização.
A pedra de toque neste contexto passa assim por saber se o arrendamento é anterior ou posterior à hipoteca, sendo que neste último caso, como vimos, o arrendamento caduca com a venda executiva.
A regra de manutenção do contrato de arrendamento é assim estabelecida claramente de forma a proteger o arrendatário, podendo, contudo, revelar-se injusta relativamente à tutela dos interesses do terceiro adquirente, basta analisarmos a situação em que o arrendatário não se encontra em pleno gozo do locado (não houve a entrega). Neste caso, acompanhamos a opinião de ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ Epifânio88 ao considerar que se deve aplicar o preceito do art. 1057º CC apenas àquelas situações em que o arrendatário é merecedor dessa tutela, ou seja, nos casos em que já foi realizada a entrega do locado, e por outro, no caso em que o adquirente, à data da celebração do negócio, possa ter conhecimento da relação arrendatícia.
Por fim, a única situação em que o adquirente pode invocar a ignorância do contrato para se subtrair ao seu cumprimento relativamente ao arrendatário é este não estar registado como devia, e nesse caso o adquirente não teria forma de saber89. Neste
87 Veja-se, - Ac. TRL de 13/02/2020, Processo: 770/18.0T8LSB.L1-87 “III - Incidindo hipotecas registadas sobre o imóvel objecto da execução, o contrato de arrendamento sobre o mesmo, celebrado posteriormente, caduca automaticamente, com a venda do imóvel arrendado, no processo executivo, ex vi art. 824/2 CC, procedendo assim a pretensão dos apelantes.”
88 In, EPIFÂNIO, ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Manual de Direito da Insolvência”, 7º Edição, Almedina, págs. 226 e 227
89 Veja-se Ac. STJ, de 09/09/2014, Revista n.º 193/04.8TBOBR.C1.S1: “III - O adquirente, sucedendo nos direitos e obrigações do locador, não pode invocar a ignorância do contrato de locação para se eximir
caso e segundo o art. 905º CC, o adquirente não está inibido de pedir a anulação no negócio com base no erro (ignorância do arrendamento).90
Para além do direito conferido pelo art. 1057º CC o arrendatário conserva ainda o direito de preferência, direito esse que sofreu várias alterações ao longo dos tempos91, sendo que neste trabalho iremos apenas abordar a redação atual do artigo com as alterações aplicadas pela Lei nº64/201892.
Através da análise do art. 1091º/1/a) CC podemos aferir que o arrendatário tem o direito de preferência na compra e venda ou na dação em cumprimento do local arrendado há mais de 2 anos, sendo este direito graduado imediatamente acima do direito de preferência conferido ao proprietário do solo (art.1091º/3 CC). A alínea a) refere “local arrendado”, não fazendo a distinção se se aplica a um prédio ou a uma fração autónoma, e neste sentido, na possibilidade de se tratar de numa alienação de um prédio que só esteja parcialmente arrendado, o arrendatário em principio não poderá fazer uso deste instituto, já que não estamos perante uma alienação total do local arrendado.
Acontece que o art. 1091º/8 CC consagra um regime especial de preferência no contrato de arrendamento para fins habitacionais relativo à parte do prédio não constituído em propriedade horizontal, já que atribui a este arrendatário o mesmo direito de preferência que é conferido ao arrendatário de fração autónoma (contrariando o que já vinha sido expresso no art. 1091º/1/a) CC).
Na prática, o disposto no nº8 refere-se ao espaço arrendado não constituído em regime de propriedade horizontal como se de uma fração autónoma se tratasse, sendo que para isso, este direito deve ser exercido em certas condições. A alínea a) deste artigo ressalva desde logo que o direito é relativo ao valor da quota-parte do prédio urbano suscetível de preferência e pelo qual o arrendatário é chamado a exercer o seu direito, o
ao seu cumprimento, salvo se a locação estiver sujeita a registo, e este não tiver sido realizado, pois, neste caso, pode limitar os efeitos do acto.”
90 LIMA, Pires de / ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇ (1987), “Código Civil”, Anotado, Vol.II, 2º Edição Revista e Atualizada, Coimbra Editora, pág. 387
91 Neste sentido veja-se no âmbito do RAU, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2006), “O exercício do Direito de Preferência”, págs. 172 a 194
92 Tendo caráter inovatório, não sendo, por isso, aplicáveis a situações em data anterior ao início da sua vigência, em 30/10/ 2018.
que será aferido proporcionalmente em função da permilagem ocupada pelo locado relativamente à totalidade do prédio.
No que diz respeito à comunicação do senhorio ,como refere a ▇▇▇▇▇▇ ▇), deve ser dirigida ao arrendatário mediante carta registada com aviso de receção (art. 9ºNRAU), e devem ser indicados de forma expressa dois valores, isto é, o valor da transmissão da totalidade do prédio e o valor proporcionalmente atribuído ao locado, a par da igualmente necessária indicação da permilagem atribuída ao locado de forma a que o arrendatário consiga perceber o correto apuramento dos cálculos e consequentemente ponderar sobre a proposta.93
A alínea c) ao referir a “afetação do uso exclusivo” levanta certas dúvidas, no sentido em que não se percebe como será processada essa afetação, já que o prédio urbano não está sujeito a propriedade horizontal. Tendemos a considerar que essa afetação não será realizada através da transmissão da propriedade do referido espaço ao arrendatário, uma vez que ficou consagrado a ausência de constituição de propriedade horizontal para o efeito.
Neste sentido EDGAR VALENTE94 acredita que a única forma de aquisição do
espaço arrendado será a compropriedade, uma vez que a consideração de qualquer outro direito real como o usufruto ou o direito de habitação desvirtuam a própria natureza do direito de preferência.
No mesmo sentido MENEZES LEITÃO95 acrescenta que esta é “(...) uma solução bastante estranha, que não se adequa minimamente ao nosso sistema de direito de compropriedade, em que os comproprietários têm igual direito de utilização da coisa comum (art. 1406º, nº1), não atribuindo o uso da coisa posse exclusiva a nenhuma deles (art. 1406º, nº2), e sendo a administração da coisa efectuada nos termos dos arts. 1407º e 985º.”
Por sua vez, o nº9 consagra a hipótese do exercício do direito de preferência conjunto, ou seja, nas situações em que o prédio urbano se encontra integralmente arrendado e todos os arrendatários têm interesse em exercer o seu direito. No caso de um dos arrendatários não pretender exercer o direito de preferência parece-nos que a
93 Vd. ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Arrendamento Urbano”, Almedina, págs. 163 e 164
94 Vd. ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Arrendamento Urbano”, Almedina, pág. 164
95 In, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”,
9ª Edição, Almedina, pág. 88
preferência continua a existir, contudo, apenas relativamente sobre as quotas do imóvel em compropriedade.
Neste contexto, ficam duas questões por responder, ou seja, a de saber se os restantes arrendatários que pretendem exercer o direito de preferência podem proceder à aquisição da totalidade do prédio, assumindo neste caso a posição contratual de senhorios dos arrendatários que não quiseram exercer o direito, e ainda, se será possível o exercício do direito de preferência naqueles casos de prédios urbanos não sujeitos a propriedade horizontal e que não se encontrem totalmente arrendados. A solução apresentada por EDGAR VALENTE96, que tendemos a acompanhar no seguimento da ausência da verificação da totalidade de requisitos de que depende o nº9, é a aplicação do preceito nº8 relativa ao destino individual de cada parte.
Apesar de levantar certas questões para qual a lei aparentemente não dá resposta, este artigo apresenta-se como uma solução favorável para o senhorio, uma vez que este consegue de facto alienar o imóvel não ficando sujeito a uma compropriedade “forçada” com o arrendatário.
Analisada a questão do direito de preferência relativo à compra e venda e dação em cumprimento do locado, o arrendatário tem ainda o direito à celebração de um novo contrato de arrendamento em caso de caducidade deste por ter cessado o direito ou terem findado os poderes legais de administração com base nos quais o contrato tinha sido celebrado (art. 1091º/1/b CC). Este direito só existirá enquanto não for exigível a restituição do locado pelo senhorio, isto é, passados seis meses sobre a verificação do facto que determina a caducidade do contrato (art. 1053º CC).
Para que o arrendatário não insolvencial tome conhecimento do seu direito de preferência é necessário que seja realizada a comunicação pelo AI prevista no art. 416º CC , onde o obrigado deve comunicar ao titular do direito, o projeto de venda e as cláusulas do respetivo contrato97, sendo expedida por carta registada com aviso de receção com o prazo de resposta de 30 dias a contar da data da receção (art. 1091º/4 CC)98. Tendemos a seguir a opinião do Doutor MENEZES LEITÃO99 ao considerar que se trata
96 In. ▇▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), “Arrendamento Urbano”, Almedina, pág. 166
97 A propósito da comunicação do direito de preferência, veja-se o Ac. STJ, de 27/11/2018, Processo: 14589/17.1T8PRT.P1.S1
98 ▇▇▇▇▇▇, ▇. ▇. ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 10ª Edição, Almedina, págs.
380 a 382
99 In, ▇▇▇▇▇▇, ▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇▇ ▇▇▇▇▇ ▇▇ ▇▇▇▇▇▇▇ (2019), Direito das Obrigações, “Arrendamento Urbano”, 9ª Edição, Almedina, pág.90
“(...) de um prazo excessivamente longo, numa situação em que se deve decidir com
urgência quem vai efectivamente adquirir um imóvel em vias de ser transacionado.”.
No caso de o AI violar o direito de preferência do arrendatário, este poderá fazer valer o seu direito através da ação de preferência prevista no art. 1410º CC (que deve ser intentada no prazo de seis meses a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação e desde que deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à propositura da ação)100.
Resulta ainda do art. 1091º/6 CC que relativamente à preferência na venda de coisas conjuntas do art. 417º CC, na comunicação dirigida ao arrendatário, o senhorio deve discriminar separadamente o preço atribuído a cada um dos bens imóveis que compõem a venda, especialmente o preço do locado para que o arrendatário possa exercer o seu direito de preferência relativamente a este. No caso de o senhorio invocar que a separação dos diversos bens imóveis lhe causa um prejuízo apreciável, o arrendatário deve fazer uso do direito de preferência sobre a totalidade dos bens que integram a venda conjunta.
Apesar disto, o art.1091º/7 CC refere que, para a demonstração da existência de um prejuízo apreciável, não pode ser invocada a simples contratualização da não redução do negócio como fundamento para o prejuízo. O arrendatário perde toda a autonomia para poder exercer o direito pela venda de uma parte da venda conjunta de uma coisa, uma vez que, a existir outro comprador que aceite a venda conjunta, o arrendatário preferente deve oferecer as mesmas condições de que o comprador, e sujeitar-se assim à compra conjunta dos bens imóveis.
Em suma, apesar de conferir uma proteção extra ao arrendatário não insolvente, o direito de preferência cede perante a realização de grandes propostas de outros compradores, o que leva a que, não raras vezes, este direito não seja suficiente para salvaguardar os interesses do arrendatário preferente que acaba por não ter capacidade financeira para acompanhar estas ofertas de terceiros.
100 ▇▇▇▇▇▇, ▇. ▇. ▇▇▇▇▇▇▇ (2016), “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 10ª Edição, Almedina, págs.
382 e ss.
Da investigação podemos retirar que se trata de um tema bastante atual que procurou dar respostas às dúvidas que surgem neste âmbito, uma vez que ainda é uma matéria pouco desenvolvida e sensível que junta áreas do saber jurídico muito distintas.
A insolvência do arrendatário e do senhorio aqui tratados incidem sobre um contrato que preenche uma necessidade imediata diferente de todas as outras, devendo, portanto, haver aqui alguma preocupação acrescida e não apenas uma finalidade “cega” da satisfação dos próprios credores.
Ao percorrermos estas matérias no CIRE também concluímos que deve ser feita uma reformulação ao art. 102º/3, que se revela confuso e de difícil aplicação devido às remissões apresentadas e à falta de objetividade e ainda uma atualização ao art.109º/1 uma vez que a renovação obrigatória foi abolida pela NRAU.
Um aspeto central nestas matérias, para que os efeitos da lei não caiam em desuso nem em procedimentos sem eficácia, é a rapidez na resolução destes casos já que, sem rapidez, a insolvência do devedor não traz resultados benéficos para os credores. Neste sentido, a justiça deve ser avaliada não só pela qualidade da decisão, mas sobretudo pelo tempo em que é proferida.
Importa ainda atentar que as mais recentes alterações legislativas têm levado mais longe a proteção do arrendatário, sendo que nem sempre foi assim, existindo um movimento que oscila no sentido das alterações políticas.
Do exposto, e para finalizar, denotamos que existe um caminho importante a percorrer no que diz respeito à problemática dos efeitos da declaração de insolvência no contrato de arrendamento urbano, já que a relação arrendatícia e as soluções que pretendemos apresentar revelam-se sempre de difícil ajuizamento, uma vez que se assemelham a uma espécie de manta curta para cobrir toda esta relação jurídica, na medida em que ao taparmos a “cabeça” do arrendatário, destapamos os “pés” do senhorio e vice-versa.
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Consulta na Internet:
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